quinta-feira, 31 de março de 2011

Boi Gigante


O poema abaixo é de autor desconhecido foi recolhido com Francisco Pereira Pontes, Chico de Naninha, e Robenilto Souza Rocha, Sirino de Alzirinha. Suas características nos dão evidências que se trata de um dos poemas da Literatura de Cordel do século XIX, quando esta era essencialmente oral.




Boi Gigante

“Convidei os companhero

pra fazê uma matutage

garrotinho de dois ano

dois ano de dismamado

turrava no fundo da larga

e convidava a cidade

garrotinho de dois ano

faltava morrê assombrado

O chifre desse boi

Mandei pru Rio de Conta

Boto cabo em mil facão

Mil e seicentas faca de ponta

Se você num tive creando

O ferreiro é que le conta

A língua desse boi

Mandei fazê um assado

Uns morreu de caganêra

Ôtos de barriga inchada

Vão disculpano, minha gente

Qu’inda ficô língua assada

Dos casco desse boi

Mandei fazê um pilão

Pra pisá canjica

Para o povo do sertão

E as garrinha que fico

Deu duas mão de pilão

O ispinhaço desse boi

Mandei fazê uma ponte

Uma ponte para um rio

Um espeio para um sobrado

E no buraco do tutano

Passava um vapô folgado[2]

O fígado desse boi

Fizero um friquité

Comeu trezentos home

Duzentos e cinqüenta muié

Cento e cinqüenta cachorro

Inda sobrô friquité

O tutano desse boi

Botaro pá derretê

Deu pá engordurá todo o feijão

Da microregião de Irecê

E fico tão gorduroso

Que ninguém pôde cumê

O coro desse boi

Fizero logo um surrão

Que deu pá botá todo o arroz

Do estado do Maranhão

O fato desse boi

Dismancharo pá sabão

Deu pá abastecê dois estado

Ciará e Maranhão

E cinco arôba que fico

Foi pras muié lavá as mão

O mocotó desse boi

Fizero a mocotozada

Deu pá cume todo mundo

Dali daquelas berada

Uns morreu de caganera

Otos de barriga inchada

E aqueles que não morrero

Dissero: oh, comida gorda danada

O rabo desse boi

Foi o que rendeu mais pôco

Fizero oito mil rédea

E um cabresto p’um cabôco

E o que mais me admirô

É que esse boi era tôco[3]


[2] Chico de Naninha ,que nos forneceu essa primeira parte do poema, o aprendeu por volta dos anos 40 ao ouvir o seu avô Bilau Moreno, Ladislau Pereira Machado, recitar para os netos. Seu Chico chegou a atribuir a autoria do poema a Bilau. Bilau (1870-1956) foi o fundador da Formosa, casou-se com Bertina, era agricultor e sua família fabricava tachos, gamelas e colheres de pau, entre outras coisas do gênero.

[3] Essa segunda parte do poema foi recolhida com Sirino, que os aprendeu quando criança, nos anos 70, com Faburino Rocha. Celito se recorda que ele afirmava que os versos não eram dele, mas a estrofes que fala da região de Irecê provavelmente se trata de uma recriação sua.

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